Texto meu, publicado no Overmundo (http://www.overmundo.com.br/overblog/um-outro-jornalismo-e-possivel). Da época da graduação. Não alterei uma vírgula. Como o outro que publiquei, nem sequer fiz uma revisão para corrigir os erros. Vai como foi.
Um outro jornalismo é possível?
Tenho uma visão equivocada do Jornalismo, já me disseram e concordo. Associo, que crime!, os membros dessa irmandade maçônica aos antigos bardos, bravos narradores de eras remotas, que muito antes do cinema inventaram um jeito de projetar imagens de longínquas odisséias para deleite dos desafortunados que passavam suas vidas miseráveis distantes dos grandes eventos. Os poetas de então rondavam léguas sem fim, perpetuando os nomes dos heróis, incitando o temor aos deuses, cativando a audiência, as mentes jovens do mundo.
Nesse ponto devo argumentar em meu favor que sou louco, que me encontro atado à nau da insânia a milhas de qualquer cais. Afinal, sugiro ter sido o grande Homero nada mais que um precursor da Imprensa! Os iluminados que compuseram os vedas não obtiveram um furo de reportagem ao dissecar a essência sutil dos homens? E, por acaso, não se valeram de alguns “critérios de noticiabilidade” os felizes autores da Bíblia? Ora, graças a Deus, naqueles tempos não havia ainda a décima terceira praga, a técnica da pirâmide invertida!
Que temos nesses exemplos, quiçá exagerados, mas ainda assim sinceros, que se possa contrapor à Mídia contemporânea e seus cânones? Simples! São boas histórias contadas de modo excepcional. Certo, quase ninguém as lê, mas ainda assim reverberam séculos após sua concepção nas mentes de seus leitores e dos leitores de seus leitores. Desfrutam de peculiar eternidade. Seguirão sendo contadas enquanto houver humanidade. Que jornalista hoje espera mais que a atenção de uns dias?
Quando entrei para a Faculdade, queria ser um colecionador de estórias. Eu partilharia minhas preciosas narrativas com todos, seria lido com a ânsia que a criança (do século XIX) lia Júlio Verne, ou os relatos de um Crusoé. Falaria de terras estranhas e de costumes estranhos, mas não dos encontravéis na face oposta do globo, não, falaria dos que estão incrustados no coração da cidade. Estenderia o mundo aos olhos do mundo, como se apresenta um bicho a si mesmo no espelho e ele se estranha.
Jornalismo para mim era partilhar experiências, engrandecer a vida de cada pessoa com relatos sublimes. Que desvio tomamos, que a informação seguiu na contramão do conhecimento? Em que momento a atualidade adquiriu tal autonomia da História? Afinal, a Humanidade é mais que o instante, é o constante. Ficar preso ao efêmero inda há de nos pôr vazios.
Tinha essa idéia estúpida quando entrei para a Universidade. Mas nada melhor para assassinar a inocência do que constantes doses desse cinismo arrogante dos acadêmicos de alma enrugada. Eles vivissecam passionalmente seu objeto de estudo, violentam com gozo, tomam posse de cada peculiaridade, cada reentrância formal. Tornam-se, enfim, donos de certas verdades invioláveis. Estabelecem dogmas ateus, como quem ergue obeliscos em honra a suas consciências fálicas, rasgando o Céu como à boceta de Pandora.
Aplicam suas regras como quem ata um cão a um canto por uma corrente cortante. Há certo sadismo de sua parte ao ver o sangue escorrer fino dos animais revoltos. Valem-se de seu sarcasmo, com um sorriso irritante, um deboche em forma de pergunta retórica... Somente quando percebem que o aluno adaptou-se à coleira, sossegam e se recostam em suas poltronas reclináveis para os delírios cotidianos.
Gostam de nos empurrar certos conceitos fugazes, inúteis, frustrantes. Não admitem, mas temem a criatividade como quem foge à cruz. Almejam a sociedades perfeitamente regradas, onde reine a infalível Moral, em que cada qual aja conforme o plano, atenha-se ao combinado, e nada seja imprevisível. Têm frêmitos ejaculatórios ao ler “A Revolução dos Bichos”.
A seus aprendizes, carneiros rumo à tosquia, nada resta senão rezar por sua cartilha. Afinal, é isso que é jornalismo, não? Ou será que um outro jornalismo é possível? A resposta, meus amigos, não me cabe dar. Leia a Bíblia.
1.5.08
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