14.4.08
humanismo e sonho
em nome de um pretenso "humanismo" muitas culturas foram desvastadas. mesmo que as pessoas não fossem destruídas, suas almas o foram. contudo, a reação a essa iconoclastia foi o isolamento das culturas. o reconhecimento da legitimidade do grupo se dá pelo atrelamento da pessoa a uma identidade que lhe é essencialmente legada. se, em nome da liberdade, o "progressismo" deixou as pessoas sem norte, se as entregou ao abandono existencial, ainda pior é a total alienação das escolhas às normas de padrão restritas dos agrupamentos fechados. o grande mal do dito "humanismo" da expansão do ocidente foi justamente o proselitismo de seus missionários. a conversão do outro em europeu (leia-se cristão) era a suposta pretensão dos conquistadores, a promessa de aceitação ocultava a armadilha assimilatória de que fala Bauman ("Modernidade e Ambivalência"). o indivíduo vindo de grupos marginalizados jamais era aceito de todo entre os "modernos", era sempre um pária, um "estranho". não à toa, a desconfiança tomou conta, o ressentimento cresceu e, aos poucos, os resistentes foram se fechando, se esmerando mais e mais em separar-se dos demais. alguns abraçaram o relativismo e chegaram a radicalizá-lo. "tudo é válido". todas as culturas têm uma forma clara, que permanece, que deve ser mantida preservada de contatos nocivos, que podem alterar seu modo de vida. a mudança é vista como algo negativo. ora, como chamamos alguém que teme a mudança? conservador! não há outro termo. parte da esquerda engoliu a retórica multiculturalista e desistiu de pensar sociedades melhores para todos. "em nome de quê vou interferir?" cuidado ao caminharem para não matar formigas. não respirem. não toquem em nada. não existam. caso contrário, estarão condenados a mudar tudo. tudo muda. a questão é "muda para o quê". cabe a nós decidir. e, se interagimos com outros, mudamos esse outros e esses outros nos mudam. nos adaptamos mutuamente. a convivência demanda algum consenso. se todas as pessoas de uma forma ou de outra convivem, elas devem se influenciar mutuamente. não podemos mais partir do princípio de que o europeu (ou quem quer que seja) é o ápice da humanidade e todos devem buscar alcançá-lo. a humanidade se fará (porque a humanidade não passa de um projeto incompleto) pela interação contínua entre as pessoas. não há porque abandonar o humanismo. basta revê-lo. regras mínimas de convivência, direitos mínimos para todos. igualdade, liberdade, fraternidade. igualdade com diversidade, porque todos são diferentes, mas ninguém é superior. a liberdade só se faz de verdade pela equitatividade da potência. a liberdade é coletiva. a fraternidade se faz pela percepção de nossa semelhança fundamental. tudo isso se completa. façamos o humano no convívio com os humanos.
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2 comentários:
"...se, em nome da liberdade, o "progressismo" deixou as pessoas sem norte..."
Não sei se as pessoas alguma vez possuiram algum norte. Não vejo as coisas como piores que antes e você sabe que nào sou "otimista". Ainda continuo achando que somos o que podemos ser, sei que posso parecer niilista, mas ainda não vejo uma razão boa o suficiente para a existência de termos como humanismo, sociedade, progreso, além de simples atribuições a padrões que nos mesmos convencionamos. Desisti a um bom tempo das discurssões ideológicas, me tornei mais "humano" do que poderiamos prever. Cansei de desvelar um véu, que sem omenor esforço volta a cobrir minha face e me anestesia, dando a impressão de que todo esforço é fugaz.
Continue na batalha por aqueles que tombaram.
fiquei muito feliz com seu comentário. nem eu sou otimista. mas tinha (e esse "tinha" tem também sua face objetiva - por conta da dissertação e das pressões do orientador) de tomar uma postura face aos fatos que analiso. esse blog é um espaço para reflexão dessas posturas, e também uma válvula de escape - para eu não acabar sendo incisivo demais nos artigos e na dissertação. ainda mais porque a teoria que estou desenvolvendo prima pelo saber-se a si mesmo, ter ciência das crenças e perseverar nas convicções. esse blog é menos um chamado à guerra e mais uma reação - nesse aspecto, é "reacionário". :D
penso em que mundo gostaria de viver e observo o rumo das coisas. se alguém quer ceifar estradas que conduzem à utopia com que sonho é natural que eu chie.
tô chegando a conclusões. não descobri o sentido da vida, mas estou desvendando o sentido que me arrebata e mais me desespera que me enche de esperança.
"todos nós estamos na lama, mas alguns sabem ver as estrelas" (Oscar Wilde). espero ser um desses. gostaria que todos fossem.
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